sábado, 2 de junho de 2012

Visão Critica

Tendo como pretexto a construção do convento de Mafra, Saramago, adotando a perspetiva de um narrador distanciado do tempo da diegese, apresenta uma visão crítica da sociedade portuguesa da primeira metade do século XVIII.
Memorial do Convento transpõe a classificação de romance histórico, uma vez que não se trata de uma mera reconstituição de um acontecimento histórico, mas é antes um testemunho intemporal e universal do sofrimento de um povo sujeito à tirania de uma sociedade em que só a vontade de el-rei.


É visível o tom irónico e, até mesmo, sarcástico do narrador relativamente à esterilidade da rainha e à infidelidades do rei. Esta atitude irónica do narrador mantém-se ao longo da obra, denunciando o comportamento leviano do rei e a sua vaidade desmedida.
O clero, que exerce o seu poder sobre o povo ignorante através da fundação de um regime opressivo entre os seus seguidores e que constantemente quebra o voto de castidade, também não escapa ao olhar crítico e sarcástico do narrador. A atuação da Inquisição que, à luz da fé cristã, manipula os mais fracos é de igual modo criticada ao longo do romance, nomeadamente, através da apresentação de diversos autos-de-fé e uma crítica às pessoas que dançam em volta das fogueiras onde se queimaram os condenados.
São sobretudo as personagens de estatuto social privilegiado o alvo da crítica do narrador que denuncia as injustiças sociais, a omnipotência dos poderosos e a exploração do povo – evidenciada nas miseráveis condições de trabalho dos operários do convento de Mafra; ao mesmo tempo que denota empatia face aos mais desfavorecidos, cujo esforço elogia e enaltece.
A crítica estende-se ainda à Justiça portuguesa que castiga os pobres e despenaliza os ricos, ao facto de se preterir os artistas e os produtos nacionais em defesa dos estrangeiros, bem como ao adultério corrupção generalizados.
Memorial do Convento constitui acima de tudo uma reflexão crítica – ao problematizar temas perfeitamente adaptáveis à época contemporânea do autor – tendente a uma releitura do passado e à correção da visão que se tem da História.


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