sábado, 2 de junho de 2012

Discurso e recursos estilisticos

Recursos de estilo
Adjetivação «...aqui vou blasfema, herética, temerária, amordaçada…»
               Hipérbole «…triste morte, foi um abalo muito grande, como um terramoto profundo que lhe tivesse rachado os alicerces…»
               Metáfora «O cântaro está à espera da fonte…»
               Ironia «…o mal é dos corpos, que a alma, essa, é perfumada…»
               Trocadilho «…o côncavo meu no teu convexo, no meu convexo o teu côncavo, é o mesmo que homem e mulher, mulher e homem…»
               Onomatopeia «…a bater a pedra, truca-truca, truca-truca…»
               Hipálage «… Romeu que, descendo, colhe o debruçado beijo de Julieta…» (334)
               Jogos de palavras e conceitos «…Fala das mãos, Falo das obras, tão cedo nascem logo morrem, Fala das obras, Falo das mãos…»

    Sátira e intertextualidade
               A sátira, com recurso à ironia, à linguagem depreciativa e humorística, à subversão de citações bíblicas («Pater noster que non estis in coelis.»);
               A rutura com as regras de pontuação, introduzindo um individual discurso direto, sem utilizar os sinais gráficos, ao extinguir os dois pontos, os travessões e o ponto de interrogação e ao utilizar a maiúscula após uma vírgula;
               A presença do narrador-autor com comentários, apartes e frases sentenciosas;
               A intertextualidade frequente, sobretudo com Os Lusíadas («…foi como o sopro gigantesco de Adamastor, se Adamastor soprou, quando lhe dobravam o cabo…»);
               A inclusão de um discurso argumentativo e reflexivo.

Provérbios originais:

       «…o sol quando nasce, é para todos…»
       «…a melhor lição é sempre o bom exemplo…»
       «…uma mão lava a outra…»,
       «…o hábito não faz o monge…»
       «…uma desgraça nunca vem só…»

Provérbios adaptados:

       «…e ainda a procissão vai na praça…»
       «…dai a César o que é de Deus e a Deus o que é de César…»
       «…fazendo o bem olhando a quem…»

       «…mas as mulheres não se medem aos palmos…»

      Discurso
  • Tom coloquial e dialogante
  • Marcas da oralidade
  • Frases parentéticas e apartes
  • Diálogos e monólogos
  • Predomínio do presente e do futuro, em detrimento das frases no pretérito como é comum na narrativa
  • Presença de discurso argumentativo e reflexivo


 

Visão Critica

Tendo como pretexto a construção do convento de Mafra, Saramago, adotando a perspetiva de um narrador distanciado do tempo da diegese, apresenta uma visão crítica da sociedade portuguesa da primeira metade do século XVIII.
Memorial do Convento transpõe a classificação de romance histórico, uma vez que não se trata de uma mera reconstituição de um acontecimento histórico, mas é antes um testemunho intemporal e universal do sofrimento de um povo sujeito à tirania de uma sociedade em que só a vontade de el-rei.


É visível o tom irónico e, até mesmo, sarcástico do narrador relativamente à esterilidade da rainha e à infidelidades do rei. Esta atitude irónica do narrador mantém-se ao longo da obra, denunciando o comportamento leviano do rei e a sua vaidade desmedida.
O clero, que exerce o seu poder sobre o povo ignorante através da fundação de um regime opressivo entre os seus seguidores e que constantemente quebra o voto de castidade, também não escapa ao olhar crítico e sarcástico do narrador. A atuação da Inquisição que, à luz da fé cristã, manipula os mais fracos é de igual modo criticada ao longo do romance, nomeadamente, através da apresentação de diversos autos-de-fé e uma crítica às pessoas que dançam em volta das fogueiras onde se queimaram os condenados.
São sobretudo as personagens de estatuto social privilegiado o alvo da crítica do narrador que denuncia as injustiças sociais, a omnipotência dos poderosos e a exploração do povo – evidenciada nas miseráveis condições de trabalho dos operários do convento de Mafra; ao mesmo tempo que denota empatia face aos mais desfavorecidos, cujo esforço elogia e enaltece.
A crítica estende-se ainda à Justiça portuguesa que castiga os pobres e despenaliza os ricos, ao facto de se preterir os artistas e os produtos nacionais em defesa dos estrangeiros, bem como ao adultério corrupção generalizados.
Memorial do Convento constitui acima de tudo uma reflexão crítica – ao problematizar temas perfeitamente adaptáveis à época contemporânea do autor – tendente a uma releitura do passado e à correção da visão que se tem da História.


Simbologia em Memorial do Convento

Convento de Mafra
D. João V, que surge na obra como um monarca libertino e vulgar manda construir um monumento que é símbolo da ostentação régia, da opressão e da vaidade dos poderosos.
      Representa o sacrifício dos operários que construíram o convento, a exploração e miséria do povo que nele trabalhou.
      Quem se sacrifica na construção, acaba por não usufruir dela.

      Passarola
      Traduz a harmonia entre o sonho e a sua realização. Graças ao sonho, foi possível juntar a ciência, o trabalho artesanal, a magia e a arte, para fazer a passarola voar.
      Representa a liberdade, a alternativa a um espaço de repressão, intolerância e violência.
      Contrariamente ao convento, a passarola é utilizada pelos seus construtores, Baltasar, Blimunda e o Padre Gusmão.

      Blimunda  
      Com o seu poder de visão, compreende as coisas sobre a vida, a morte, o pecado e o amor.
      O olhar de Blimunda é o olhar da «História» que o narrador exercita, denunciando a moral duvidosa, os excessos da corte, o materialismo e hipocrisia do clero, as injustiças da Inquisição, o terror, o obscurantismo de uma época, a miséria e as diferenças sociais.
 Número Sete

      Sol
      Como o Sol, que todos os dias tem de vencer os guardiães da noite (mitologia antiga), também Baltasar vence as forças obscuras da ignorância e da intolerância ao voar.

      Lua
      Associada a Blimunda, lembra o seu mágico poder de «ver às escuras», embora este esteja condicionado (só vê o interior das pessoas em jejum e quando não há quarto de lua).
 Cobertor

      Trazido da Holanda pela rainha, torna-se símbolo da separação que marca o casamento de conveniência do casal régio. Exprime a frieza do amor, a ausência do prazer, os desejos insatisfeitos.
 Colher

      Quando partilhada, é um símbolo da aliança, do compromisso sagrado que vai unir para sempre as duas personagens populares. Exprime o amor autêntico, a atração erótica e apaixonada, a vivência plena do prazer.
      Símbolo do ritmo biológico da Terra, traduz a força vital que é representada pelas vontades recolhidas por Blimunda para fazer voar a passarola.
      Associado a Baltasar e ao povo, sugere a ideia de vida, de renovação de energias (o povo trabalha até à exaustão no convento, Baltasar constrói uma máquina, mesmo depois de decepado).
      Sete são as vezes que Blimunda passa em Lisboa, em demanda de Baltasar. Esse número regula os ciclos da vida e da morte na Terra e pode ligar-se à ideia de felicidade, de totalidade, de ordem moral e espiritual.

Categorias da narrativa


Momentos da acção:
             - introdução: motivar o desenvolvimento, apresentar personagens, dar informação sobre o tempo, espaço ou antecedentes.
                  - desenvolvimento: encerra a sucessão de acontecimentos mais marcantes.
                  - conclusão:  sequência final.

Personagens
Relevo
            - principal: personagem que se destaca mais na acção;
                - individual: só ela ou colectiva: várias personagens agem da mesma maneira
                - secundárias: interagem com a personagem principal relacionando-se com ela;
                - figurantes: não têm intervenção na acção, mas ajudam a criar o ambiente.
Conceção:
                - personagem modelada: revelar sobre aspectos relacionados com a vida profissional, privada, vícios, drama interior ou ânsia de liberdade e a personagem vai mudando o seu comportamento mostrando-se cada vez mais complexa e psicologicamente activa.
                - personagem plana: quando nunca evolui nem demonstra densidade psicológica.

 Espaço da ação
                - espaço físico: onde decorre a acção
                - espaço social: quando existem elementos caracterizadores do ambiente e condição económica das personagens.
                - espaço psicológico: quando forem dadas a conhecer existências especiais condicionadas pelo estado emocional das personagens.

Tempo da acção
           
- Tempo cronológico: expressões de contagem de tempo “naquele dia”; “ontem”, “há poucos dias” designadas por notações temporais.
                - Tempo psicológico: mais curto ou mais longo do que o tempo cronológico depende da existência do tempo “Como o tempo corria devagar”; “As horas passaram a correr”.
Narrador
               
Participação
heterodiegético - o narrador é não participante, não faz parte da diegese.
Homodiegético - o narrador faz parte da diegese
Autodiegético - o narrador é a personagem principal da diegese

Focalização
Externa - o narrador limita a narrativa à representação de aspetos superficiais e materialmente observavéis de uma personagem, espaço ou de certas ações.
Interna - o narrador adota o ponto de vista de uma personagem.
Omnisciente - o narrador conhece todos os pormenores da história










Memorial do Convento


José Saramago




José de Sousa Saramago (Golegã, Azinhaga, 16 de Novembro de1922  Tías, Lanzarote, 18 de Junho de 2010) foi um escritor, argumentista,teatrólogo, ensaísta, jornalista, dramaturgo, contista, romancista e poeta português.
Foi galardoado com o Nobel de Literatura de 1998. Também ganhou. em 1995, o Prémio Camões, o mais importante prémio literário da língua portuguesa. Saramago foi considerado o responsável pelo efectivo reconhecimento internacional da prosa em língua portuguesa.
O seu livro Ensaio Sobre a Cegueira foi adaptado para o cinema e lançado em 2008, produzido no Japão, Brasil, Uruguai e Canadá, dirigido por Fernando Meirelles. Em 2010 o realizador português António Ferreira adapta um conto retirado do livro Objecto Quase, conto esse que viria dar nome ao filme Embargo, uma produção portuguesa em co-produção com o Brasil e Espanha.
Nasceu no distrito de Santarém, na província geográfica do Ribatejo, no dia 16 de Novembro, embora o registo oficial apresente o dia 18 como o do seu nascimento. Saramago, conhecido pelo seu ateísmo e iberismo, foi membro do Partido Comunista Português e foi director-adjunto do Diário de Notícias. Juntamente com Luiz Francisco Rebello, Armindo Magalhães, Manuel da Fonseca e Urbano Tavares Rodrigues foi, em 1992, um dos fundadores da Frente Nacional para a Defesa da Cultura (FNDC). Casado, em segundas núpcias, com a espanhola Pilar del Río, Saramago viveu na ilha espanhola de Lanzarote, nas Ilhas Canárias.

Simbologia


A saia verde
Quando Matilde assiste à morte do seu companheiro, tem vestida uma saia verde. A saia é uma peça feminina e o verde está associado à esperança, transmitindo uma sensação e repouso. 
A saia que Matilde veste, foi-lhe comprada pelo General Gomes Freire em Paris, terra da liberdade.
Não se veste de luto, mas sim de uma cor que conota amor pelo seu companheiro e a esperança de que a sua morte dê lugar à renovação.

A noite
É durante a noite e madrugada que se efetuam as prisões e as execuções prolongam-se pela noite. A noite traduz a tormenta e a aflição.

A Lua
Para Matilde, o luar permite que todos observem as injustiças cometidas com a morte do general, havendo assim a possibilidade de transformação e revolução.

A fogueira e o lume
Quando Matilde afirma que a fogueira que servira para queimar o general ainda havia de "incendiar esta terra!", coloca a esperança no espetador, envolvendo-o para que mantenha a chama viva da esperança - há-de chegar a liberdade.

Paralelismo entre o passado representado e as condições históricas dos anos 60


Tempo da História
(século XIX – 1817)
Tempo da escrita
(século XX – 1961)
- Agitação social que levou à revolta liberal de 1820 – conspirações internas; revolta contra a presença da Corte no Brasil e influência do exército britãnico
- Regime absolutista e tirano
- Classes sociais fortemente hierarquizadas
- Classes dominantes com medo de perder privilégios
- Povo oprimido e resignado
- A “miséria, o medo e a ignorância”
- Obscurantismo, mas “felizmente há luar”
- Luta contra a opressão do regime absolutista
- Manuel, “o mais consciente dos populares”, denuncia a opressão e a miséria
- Perseguições dos agentes de Bereford
- Agitação social dos anos 60 – conspirações internas; principal irrupção da guerra colonial
- Regime ditatorial de Salazar
- Maior desigualdade entre abastados e  pobres
- Classes exploradas, com reforço do seu poder
- Povo reprimido e explorado
- Miséria, medo e analfabetismo
- Obscurantismo, mas crença nas mudanças
- Luta contra o regime totalitário e ditatorial
- Agitação social e política com militares antifascistas a protestarem
- Perseguições da PIDE


Felizmente Há Luar!  é um drama épico dentro dos princípios do teatro épico. Na linha do teatro de Brecht, exprime a revolta contra o poder e a convicção de que é necessário mostrar o mundo e o homem em constante mudança.
 Na peça de Sttau Monteiro é possível verificar que são estes também os objectivos, pelo evocar de situações e personagens do passado, como pretexto para apresentar o presente (ditadura nos anos 60 do século XX) e assim pôr em evidência a luta do ser humano contra a tirania, a opressão, a traição, a injustiça e todas as formas de perseguição. 


Felizmente há luar!


Luís de Sttau Monteiro


Nasceu a 3 de Abril de 1926 em Lisboa, cidade onde viria a morrer a 23 de Julho de 1993. Era filho de Armindo Rodrigues de Sttau Monteiro e de Lúcia Rebelo Cancela Infante de Lacerda.
Com 10 anos de idade mudou-se para Londres com seu pai, embaixador de Portugal. Contudo, em 1943 este último é demitido do seu cargo por Salazar o que obriga pai e filho a regressarem a Portugal.
Já em Lisboa, licenciou-se em Direito, que exerceu por um curto período de tempo, dedicando-se depois ao jornalismo. A sua estadia em Inglaterra, durante a juventude, pô-lo em contacto com alguns movimentos de vanguarda da literatura anglo-saxónica. Na sua obra narrativa retrata ironicamente certos estratos da burguesia lisboeta e aspectos da sociedade portuguesa sua contemporânea.
Vai novamente para Londres e torna-se piloto de Fórmula 2.
Ao regressar a Portugal colabora em diversas publicações destacando-se a revista Almanaque e o suplemento A Mosca do Diário de Lisboa. Neste último, cria a secção Guidinha.
Estreou-se, em 1960, com Um Homem não Chora, a que se seguiu Angústia Para o Jantar (1961), obra que revela alguma influência de escritores ingleses da geração dos angry young men, que o consagrou, e E Se For Rapariga Chama-se Custódia (1966).
Destacou-se, sobretudo, como dramaturgo, nomeadamente com Felizmente há Luar! (1961), peça que, sob influência do teatro de Brecht e recuperando acontecimentos da anterior história portuguesa, procurava fazer uma denúncia da situação sua contemporânea. Esta peça foi publicada em 1961, tendo sido galardoada com o Grande Prémio de Teatro. A sua representação foi, no entanto, proibida pela censura.


wikipédia, em http://pt.wikipedia.org/wiki/Lu%C3%ADs_de_Sttau_Monteiro